“Desafios do Associativismo Cultural Algarvio”


Desafios do Associativismo Cultural Algarvio
Artigo do mês de Dezembro (2010) para o Suplemento cultural "Cultura.S" do Jornal Postal do Algarve. 

As sociedades são imprevisíveis, sendo que as crises são momentos cruciais de transformações sociais, políticas e económicas. Estas implicam uma responsabilização maior para os que nele têm capacidade de intervenção e reflexão sobre o que é hoje a contemporaneidade, a redefinição das identidades, os novos fluxos (de pessoas e de mercados), as novas centralidades, e, em particular, a importância definitiva que as cidades, nesta época de transnacionalidade, adquirem e como se expressa a produção artística e cultural neste contexto.
A diversidade de dinâmicas sociais e a criação de novos espaços de afirmação de cidadania, levam a alterações do paradigma do associativismo do pós 25 Abril, cuja génese era a promoção da convivência social, ocupação dos tempos livres, expressar publicamente pensamentos e relações de amizade, juntando pessoas em redor de ideais ou ações sociais. Uma realidade que vai perdendo força para novos espaços virtuais e redes sociais. As associações são entidades sem fins lucrativos, onde se trabalha para um bem comum, sendo um exercício de cidadania, prestando assim um serviço público. Promovem a integração social e tem um papel determinante na promoção da cultura. Mas qual será o seu papel na construção da cidadania do século XXI? 
O tecido associativo em Portugal é diverso e complexo. Manifesta-se desde ações coletivas e/ou sectoriais a estruturas associativas que prestam serviços profissionais. A falta de caracterização e identificação desta realidade só contribui para a promiscuidade e fragilidade do tecido associativo. Como se cria instrumentos de justiça social, de financiamento e de oportunidades, dentro de um espectro tão alargado?
A “profissionalização” dos agentes culturais, a procura de estratégias e modelos de gestão, a criatividade e inovação, o financiamento, a construção de redes, a internacionalização e a mobilidade cultural, mas também a responsabilização e a avaliação, serão certamente apenas algumas das respostas ao sector. Formar competências nas áreas da gestão, programação, produção e divulgação culturais, criando pontos de confluência entre a investigação académica e a experiência artística; desenvolver uma relação íntima entre as opções de gestão e as opções estéticas, éticas e filosóficas dos criativos, nunca esquecendo as pessoas, seus interesses e necessidades. Este mostra-se como um futuro possível...
Numa perspectiva de cada vez menos financiamento público para a cultura, cabe ao agente cultural aperfeiçoar a sua gestão, as estratégias de financiamento, identificar as diversas formas de comunicação existentes e aplicá-las de modo eficiente, promovendo o desenvolvimento sustentável e a responsabilidade social. A internacionalização, as redes e parcerias e a mobilidade do associativismo do Algarve e dos seus projetos culturais é um ponto fundamental nesta equação. É desejável que o associativismo cultural algarvio promova cada vez mais práticas de mobilidade internacional. Mas como fazê-lo se continuamos fechados sobre nós próprios? O associativismo cultural no Algarve vive da relação com o poder local, muitas vezes com o poder regional, raramente com o poder central.
Esta mudança de paradigma de organização de amigos com afinidades comuns, para uma estrutura profissionalizante é ainda uma realidade distante. Mas, transformar uma lógica de companheirismo, fraternidade e solidariedade, num paradigma comercial (e empresarial), com um fim de consumo - um produto cultural – será desejável para o nosso tecido associativo? Onde fica o processo criativo nisto tudo? E a reflexão, as estéticas e o pensamento crítico e artístico? E a possibilidade de qualquer pessoa experimentar uma expressão artística sem aspirar a ser um profissional da cultura? Estarão as associações culturais algarvias preparadas para esta transformação? Será este o modelo associativo a seguir?
O associativismo de ontem, tem novas perspectivas e paradigmas nos dias de hoje. Os problemas de manter tradições e trabalhar expressões artísticas contemporâneas continuam a desafiar o associativismo cultural algarvio. Como irá refletir e manifestar-se a sociedade civil, por meio do associativismo cultural, com os desafios do amanhã, e, como se irá espelhar essa relação com a economia social do futuro? E qual o seu impacto na comunidade globalizada?                                                        

Pedro Nascimento
Produtor Cultural
Sócio AGECAL – Associação de Gestores Culturais do Algarve

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